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ELYSEU POR ELYSEU

Janeiro de 2013

 

Eliseu d'Angelo Visconti, pintor italiano que veio para o Brasil em 1873, foi o maior representante do impressionismo no país. Único de seus dez netos a ser retratado pelo avô, Elyseu Visconti herdou dele, além da pintura, o nome e o talento para as artes. Cineasta, autor de dois longas de ficção e dezenas de documentários, ele contesta até hoje o rótulo que recebeu décadas atrás. “Não sou maldito, não”, indigna-se, 43 anos depois de receber essa definição do cinema-novista Glauber Rocha. “Aquele mimado irresponsável era bem mais deputado que cineasta. Ao nos chamar de marginais, afastou-nos do interesse do público e da imprensa”.

Como você decidiu ser cineasta?

Estudei artes plásticas na Escola Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro e, nesse período, os professores diziam que as minhas pinturas e gravuras eram muito cinematográficas. Além disso, eu já trabalhava na TV Rio, como assistente do Walter Clark, onde desenvolvi noções de roteiro, de argumento e de câmera. Nessa época, fui chamado pelo diretor Fernando Coni Campos para fazer o roteiro do filme Morte em Três Tempos (1967). O longa era um drama policial sobre o assassinato de uma linda mulher em sua casa na praia, baseado em um conto de Luiz Lopes Coelho. Aprendi que o argumento de um filme é fundamental e, principalmente, que cinema é muito mais do que “segurar a câmera”; é física, literatura e arquitetura. Pouco depois, consegui uma bolsa do governo francês para estudar cinema em Paris e nunca mais parei.

Alguns dos diretores classificados como “marginais” não gostam desse rótulo.

Como você vê essa questão?

É realmente um absurdo. Eu, Júlio Bressane, Andrea Tonacci, Neville d’Almeida e muitos outros lutamos por um cinema autoral, libertário e que rompesse com os valores tradicionais. Glauber Rocha usou sua política comunista e o estrelismo que conquistou com o Cinema Novo para nos perseguir. Rotulou-nos de marginais e de fascistas. Ele foi um irresponsável que castrou várias gerações. Era muito mais deputado que cineasta. Nosso trabalho não tem nada de maldito. Glauber dizia, inclusive, que não éramos engajados, mas fizemos filmes que continham críticas sociais, como Matou a Família e Foi ao Cinema (1991), do Neville, e Os Monstros de Babaloo, de minha autoria. Além disso, fomos censurados pela ditadura. Meu filme ficou 10 anos parado na censura e, nos anos 70, durante o governo do Médici, fui preso. Fico feliz que agora, pelo menos, estamos sendo vistos e reconhecidos por nossa estética no Brasil.

Como você começou a fazer documentários etnográficos?

Quando ganhei minha bolsa para estudar cinema em Paris, trabalhei por cinco meses como assistente do diretor francês Jean Rouch no documentário A África de Hoje. Ele me ensinou a usar a câmera acoplada a um gravador, a captar e a respeitar imagens da realidade. Meu interesse por documentários e pela preservação das culturas despertou naquela época. Depois dessa experiência, não parei de estudar antropologia. Então, quando meu filme foi censurado no Brasil, desisti de fazer ficção e me auto exilei no interior do Nordeste. Com a herança que tinha recebido do meu pai, comecei a produzir documentários etnográficos por lá. Os antropólogos Gilberto Freyre e Câmara Cascudo foram meus mentores na elaboração desses registros folclóricos pelo interior do país. Em 1972, fui para Índia e, de lá, produzi 10 documentários etnográficos para a BBC de Londres.

Qual sua opinião sobre a produção de cinema brasileira atual?

O cinema brasileiro está muito medíocre. A maior parte da produção não passa de uma cópia mal feita dos filmes hollywoodianos. Acompanho mesmo sem gostar. A Suprema Felicidade (2010), do Arnaldo Jabor, por exemplo, deve ter tido muito dinheiro, mas é totalmente focado na decoração e no cenário, sem nada de inovador. O diretor não se preocupa em ter um estilo criativo, inventivo. O resultado é oco. Para mim, Amácio Mazzaropi foi o maior realizador que tivemos. Ele era muito autêntico e criativo.

Atualmente, a que você tem se dedicado?

Tenho dois projetos maiores em andamento: um deles se chama Glória Pátria e Cruzeiro do Sul. Será uma mistura de documentário com ficção, um retrato carnavalesco sobre a história do país a partir do Golpe de 64. O enfoque é a sátira aos governantes do país, de João Goulart a Dilma Roussef. A presidente, por exemplo, aparecerá no longa como uma vendedora da Avon. O segundo trabalho é um desenho animado que se chamará Vende-se Galinhas Falecidas. A história será sobre um galinho garnizé que nasce na pré-história, mora um tempo no México e depois vai viver em Minas Gerais.

Entrevista à revista BRAVO!

http://bravonline.abril.com.br/materia/bravo-entrevistaelyseu-visconti#image=av-elyseu-visconti-1

Entrevista para Revista do Cinema Brasileiro 2004
Registros que narram um trecho de história viva da nossa cultura popular de raiz, travando assim um diálogo entre nossos contextos e relances de memória com o rico trabalho de pesquisa audiovisual de Elyseu Visconti Cavalleiro.
Elyseu resgata em registros nossa tradição folclórica para dar destaque aos encantos da brasilidade miscigenada e plural que se encontra no entorno do sincretismo religioso dos ritmos, sabores e texturas ao passo cadente dos pés descalços, corpos inteiros movidos pela alma.
 
O olhar deste apresentador da “História Normal do Povo”, comprometido com uma antropologia visual não acrescenta, distorce ou mascara seu objeto de pesquisa, apenas desvela aquilo que já poucos conseguem se lembrar e que ao mesmo tempo embasa nosso repertório simbólico brasileiro.
Este conteúdo aqui apresentado já foi levado à França (Assembleia Geral da UNESCO, 1983 e Galerie Nacionale, Jeu de Paume, 1992), Holanda (Tropen Museun, 1983), Portugal (Museu de Arqueologia e Etnografia, 1994) e Alemanha (Universidade de Konstanz, 1995) - além de mostras na FUNARTE em 1982 e 1983 - agregando suas últimas intervenções, entrevistas e fotos. Com organização do Instituto Via Cultural, mostras no CineSESC SP e SESC Palladium BH em 2013.
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